terça-feira, 24 de dezembro de 2013

Eles amam odiar Maringá



Crônica

Eles amam odiar Maringá

Do padre Orivaldo Robles:


Crônica

Eles amam odiar Maringá

Do padre Orivaldo Robles:
padreorivaldoNão levem a mal a declaração deste caipira: considero minha esta cidade, que amo com ternura ingênua. Para cá vim faz 56 anos. Minha primeira impressão de Maringá foi assustadora, para dizer o mínimo. Era o dia 29 ou 30 de dezembro de 1957, não lembro bem. O ônibus parou na Praça Raposo Tavares. Desci no descampado ainda com marcas de árvores removidas em passado recente. Arregalei os olhos para uma Maringá de poeira, calor e gente feia. E, sem cachê nem ensaio, me vi como um figurante daqueles filmes de faroeste da minha infância.
Eu ia para Alto Paraná. Desde setembro, minha família morava lá. Morar ali ou em Maringá, para mim, era quase a mesma coisa. Eu estudava em Curitiba. Férias de fim de ano eu passava parte em casa, parte na residência episcopal. Assim chamávamos a casa de Dom Jaime, na Rua Lopes Trovão, atrás do Hospital Santa Rita. Maringá ainda era um monte de casas de madeira. Para o bispo, empossado em 24 de março de 1957, providenciaram uma de alvenaria. Em função da necessidade, foram-lhe acrescentando novos cômodos. Alguns nunca recebiam luz do sol. Nem secretário o bispo tinha. Eu concluíra o curso ginasial e era bom em latim. Ele apreciava a ajuda que eu lhe podia dar. Como traduzir para a Santa Sé o relatório sobre a vida da diocese. Na época, o documento tinha que ser remetido em latim. Em 1963 comecei a Teologia. Foi quando minha família veio para Maringá.
Que mágica atração exerce esta cidade? Revolvo lembranças antigas como gravuras em sépia. Amareladas, baças, encardidas, porém intensas. Maringá não revelou, no início, a plástica de uma jovem esfuziante de beleza. Nasceu roceira, vestida de verde e cheirando a mato. Acanhada e suja de terra, lentamente foi mostrando seu dengo de mulher vaidosa. Com dez anos, despertou em mim um amor rústico, mas sincero. Como o dedicado a uma irmã caçula, que a gente ajuda a criar. Quem dá a mão para firmar os passos da infância vai sempre sentir uns laivos de ciúme. E revolta, às vezes.
Domingo passado cheguei à Catedral, como sempre, às seis e vinte da manhã. Contornei-a pelo lado do Parque do Ingá. É de chorar o tratamento dado à menina que vimos crescer. Já me falaram que foi infeliz a reforma da Praça da Catedral. O que não era grande coisa ficou pior. Reduziu-se a cobertura verde e aumentou-se o calor. Quem sou eu para dar palpite? Não sou arquiteto nem urbanista. Sou só um apaixonado por esta cidade.
Mas uma coisa é clara: alguns amam odiar Maringá. Está evidente na sujeira dos espelhos d’água e suas muretas, nas garatujas dos grafiteiros, nos cascos vazios de bebidas e outras imundícies despejadas na praça. Não dá vergonha e uma raiva de doer?
Jamais fiz algo grandioso. Faço o pouco de que sou capaz pelo bem de Maringá. Sei que não sou o único indignado com quem chegou outro dia, não move um dedo pela comunidade e se mete grosseiramente a depredar a cidade que construímos.
Todos os dias a Catedral recebe visitantes de várias procedências Olham, fotografam, filmam. De volta para suas cidades, talvez pensem: “Que povo estranho. Ergue um monumento que projeta internacionalmente sua cidade. Depois, suporta desordeiros que transformam sua praça em pocilga”.
Muito estranho, sem dúvida.

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